sábado, 24 de janeiro de 2009
wake up, jones
Jairo Jones acordou meio atordoado naquela manhã úmida e cinza de janeiro. Não por conta dos golpes que havia tomado na noite anterior, mas dos tragos que foram muitos e bons, disso ele se lembrava bem.
Caminhou de ceroulas até o espelho e viu do que se tratava a dor que tanto incomodara seu sono justo: o olho direito estava roxo e inchado. "Cacete, aquele idiota pelo jeito batia bem", pensou o velho Jones. Em seguida, examinou suas mãos, também inchadas, apesar das luvas. "Eu devo ter batido muito também."
Abriu a vista para a rua General Jardim, foi até a pequena cozinha, esquentou a água, encharcou o pó, buscou o copo e acendeu o cigarro. "Preciso ligar para o Meio-Quilo e perguntar o que aconteceu." Como flashes, lógico, golpes começaram a pulular nas lembranaças de Jairo: "Jabs, cruzados, uppers, repare o jogo de pernas... Eu bati bem naquele... Quem era mesmo o adversário?"
Voltou para a cama, viu um pedaço do teto quase desabando sobre ele. "Preciso ligar para o Meio-Quilo e arrumar essa merda... Deixa pra lá... Ganhar ou perder, que diferença faz? O importante é continuar dando porrada."
Adormeceu novamente, sem saber que seus troféus e medalhas da noite anterior ornamentavam a entrada de um bordel da Augusta.
Jairo Jones gasta todo o dinheiro que ganha nos ringues com bebidas e mulheres. Chega a tomar uma média de trinta socos na cara por luta. Está ficando com a memória lesada, mas não tem coragem de enfrentar uma tomografia porque morre de medo de ficar preso dentro da máquina.
Já falei que Jairo Jones gasta todo o dinheiro que ganha nos ringues com bebidas e mulheres?
quinta-feira, 22 de janeiro de 2009
o lobisomem
O amor é para mim um Iroquês
De cor amarela e feroz catadura
Que vem sempre a galope, montado
Numa égua chamada Tristeza.
Ai, Tristeza tem cascos de ferro
E as esporas de estranho metal
Cor de vinho, de sangue, e de morte,
Um metal parecido com ciúme.
O Iroquês sabe há muito o caminho e o lugar
Onde estou à mercê:
É uma estrada asfaltada, tão solitária quanto escura,
Passando por entre uns arvoredos colossais
Que abrem lá em cima suas enormes bocas de silêncio e solidão).
Outro dia eu senti um ladrido
De concreto batendo nos cascos:
Era o meu Iroquês que chegava
No seu gesto de anti-Quixote.
Vinha grande, vestido de nada
Me empolgou corações e cabelos
Estreitou as artérias nas mãos
E arrancou minha pele sem sangue
E partiu encoberto com ela
Atirando-me os poros na cara.
E eu parti travestido de Dor,
Dor roubada da placa da rua
Ululando que o vento parasse
De açoitar minha pele de nervos.
Veio o frio com olhos de brasa
Jogou olhos em todo o meu corpo;
Encontrei uma moça na rua,
Implorei que me desse sua pele
E ela disse, chorando de mágua,
Que era mãe, tinha seios repletos
E a filhinha não gosta de nervos;
Encontrei um mendigo na rua
Moribundo de fome e de frio:
“Dá-me a pele, mendigo inocente,
Antes que Ela te venha buscar.”
Respondeu carregado por Ela:
“Me devolves no Juízo Final?”
Encontrei um cachorro na rua:
“Ó cachorro, me cedes tua pele?”
E ele, ingênuo, deixando a cadela
Arrancou a epiderme com sangue
Toda quente de pêlos malhados
E se foi para os campos da lua
Desvestido da própria nudez
Implorando a epiderme da lua.
Fui então fantasiado a travesti
Arrojado na escala do mundo
E não houve lugar para mim.
Não sou cão, não sou gente - sou Eu.
Iroquês, Iroquês, que fizeste?
Décio Pignatari
De cor amarela e feroz catadura
Que vem sempre a galope, montado
Numa égua chamada Tristeza.
Ai, Tristeza tem cascos de ferro
E as esporas de estranho metal
Cor de vinho, de sangue, e de morte,
Um metal parecido com ciúme.
O Iroquês sabe há muito o caminho e o lugar
Onde estou à mercê:
É uma estrada asfaltada, tão solitária quanto escura,
Passando por entre uns arvoredos colossais
Que abrem lá em cima suas enormes bocas de silêncio e solidão).
Outro dia eu senti um ladrido
De concreto batendo nos cascos:
Era o meu Iroquês que chegava
No seu gesto de anti-Quixote.
Vinha grande, vestido de nada
Me empolgou corações e cabelos
Estreitou as artérias nas mãos
E arrancou minha pele sem sangue
E partiu encoberto com ela
Atirando-me os poros na cara.
E eu parti travestido de Dor,
Dor roubada da placa da rua
Ululando que o vento parasse
De açoitar minha pele de nervos.
Veio o frio com olhos de brasa
Jogou olhos em todo o meu corpo;
Encontrei uma moça na rua,
Implorei que me desse sua pele
E ela disse, chorando de mágua,
Que era mãe, tinha seios repletos
E a filhinha não gosta de nervos;
Encontrei um mendigo na rua
Moribundo de fome e de frio:
“Dá-me a pele, mendigo inocente,
Antes que Ela te venha buscar.”
Respondeu carregado por Ela:
“Me devolves no Juízo Final?”
Encontrei um cachorro na rua:
“Ó cachorro, me cedes tua pele?”
E ele, ingênuo, deixando a cadela
Arrancou a epiderme com sangue
Toda quente de pêlos malhados
E se foi para os campos da lua
Desvestido da própria nudez
Implorando a epiderme da lua.
Fui então fantasiado a travesti
Arrojado na escala do mundo
E não houve lugar para mim.
Não sou cão, não sou gente - sou Eu.
Iroquês, Iroquês, que fizeste?
Décio Pignatari
segunda-feira, 19 de janeiro de 2009
every time we say goodbye
Tem dor de peito
que não há jazz
que dê jeito
* Dia desses, escalei, em uma brincadeira entre amigos, minha seleção de jazz de todos os tempos: Coltrane, sax tenor, Miles, trompete, Mingus, contrabaixo, Elvin Jones, bateria, Julian Cannonball, sax alto e Bill Evans, piano. (Sim, deixei o bepob inteiro fora, paciência).
Mas o piano de McCoy Tyner (no vídeo acima com Coltrane e Jones) também é maravilhoso.
quinta-feira, 15 de janeiro de 2009
silêncio, por favor
Dormirei abraçado a meus sapatos
furados de tanto andar por avenidas
Neles talvez esteja impresso o mapa
dos descaminhos desta dor alpinista
Não me acordem.
furados de tanto andar por avenidas
Neles talvez esteja impresso o mapa
dos descaminhos desta dor alpinista
Não me acordem.
terça-feira, 13 de janeiro de 2009
sábado, 10 de janeiro de 2009
fortuna crítica
Todos os crimes
são de Raskolnikov
Os castigos também
Todas as traições
são de Emma Bovary
Os desejos também
Todas as dúvidas
são de Bentinho
As certezas também
Todas os conflitos
são de Hamlet
As tragédias também
Todas as bebedeiras
são de Chinaski
As ressacas também
Todas as estradas
são de Dean Moriarty
As encruzilhadas também
Todos os sofrimentos
são do Jovem Werther
Os gozos também
Todo os sons
são de Faulkner
A fúria também
Todos os mojitos
são de Hemingway
Os dry-martinis também
Toda a espera
é de Penélope
As mentiras também
Todo o mau-caratismo
é de Basílio
O amor de Luiza também
Toda a sorte
é de quem sabe ler
A desgraça também
são de Raskolnikov
Os castigos também
Todas as traições
são de Emma Bovary
Os desejos também
Todas as dúvidas
são de Bentinho
As certezas também
Todas os conflitos
são de Hamlet
As tragédias também
Todas as bebedeiras
são de Chinaski
As ressacas também
Todas as estradas
são de Dean Moriarty
As encruzilhadas também
Todos os sofrimentos
são do Jovem Werther
Os gozos também
Todo os sons
são de Faulkner
A fúria também
Todos os mojitos
são de Hemingway
Os dry-martinis também
Toda a espera
é de Penélope
As mentiras também
Todo o mau-caratismo
é de Basílio
O amor de Luiza também
Toda a sorte
é de quem sabe ler
A desgraça também
sábado, 3 de janeiro de 2009
cinema falado
Ela na plataforma de olhos perdidos
Ah, Bogart, meu caro, me socorra
Era eu quem devia fazer isso
Quem nunca devia ter partido
Eu, estanque na calçada
Bill, meu velho, que noite escura!
Ensine o truque que grita mais
Quem apenas chora e sussura
Nós, rumo ao capítulo desconhecido
Monsieur Doinel, quero aprender o olhar à esguelha
Em uma praça, pentear nela a sobrancelha
Viver tudo tal qual talvez afinal
Hey, Man!
Vamos fazer uma lista?
Grandes perdas?
Maiores conquistas?
Sim.
Não!
Quem diria!
Ainda chegará o dia...
No final, noves fora
Neve lá fora (porque agora é cinema!)
Please, dont`t chora.
Eu estou aqui.
Baby.
ps: os quatro vídeos são curtos e bem legais.
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