quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

purificções/tocando a vida

Corria o segundo dia do curso teórico de formação de condutores e Antônio Carlos ainda não havia conseguido trocar palavras com os colegas de sala. No máximo, um rápido e tímido olhar com a moça à direita. "Deve ser por causa da minha idade", pensava ele, que decidira tirar a licença somente aos 34 anos.
No intervalo do café, ele se aproximou de Amália:
_Tirando carta?
_O que você acha?
A resposta desconcertou Antônio Carlos. "Como posso ser tão imbecil?", pensou.
Amália prosseguiu:
_Vou tomar a vida com as próprias mãos.
De volta à sala, a moça foi escolhida pelo instrutor para simular uma vítima de colisão na aula de primeiros-socorros. Antônio Carlos buscou forças e se ofereceu para participar do exercício. Ficaria responsável por tentar reanimar a acidentada.
"Tomar a vida com as próprias mãos", repetia para si mesmo Antônio Carlos. Assim que o instrutor deu o sinal, ele caminhou até o centro do círculo formado pelas carteiras, onde Amália jazia sobre um colchonete, ajoelhou-se ao lado do corpo, enfiou a mão esquerda nos fartos cabelos da moça e se abaixou. "Como ela é cheirosa."
A turma e o professor só perceberam que aquilo não se tratava de respiração boca a boca quando o casal começou a se abraçar entre suspiros.
Os dois demoraram para conseguir a carteira de motorista, mas continuam tocando a vida com as próprias mãos.

Nenhum comentário: